Em A Mãe que Desistiu do Céu, Mario Tamassia, um dos melhores escritores espíritas, reporta-se a uma mulher que, em face de seus méritos, foi alçada ao Céu após a morte. Ali soube que o filho estava no Inferno. Dirigindo-se aos seus superiores, explicou:
- Então me perdoem. Não posso ficar aqui no Céu e meu filho no Inferno. Vou-me embora para ajudá-lo. Coitado do Ditinho, ele deve estar precisando de mim.
O episodio ilustra bem o que é o amor materno – o mais sublime de todos – capaz de renunciar às alegrias celestiais para socorrer o filho nas regiões infernais.
E não é exatamente isso que ocorre na Terra, este imenso purgatório, onde vemos mulheres abnegadas sacrificando-se em favor de filhos transviados, presos, não raro, à grades de sofrimentos regeneradores? Só esse relato vale o livro. Mas há muito mais, sobretudo a encantadora história que o autor denominou “O Carvalho Embandeirado de Esperança”, que, pedindo licença ao estimado Tamassia, transcrevemos:
“Um grupo de rapazes e moças resolve fazer uma viagem turística rumo à cálida Flórida, deixando a região fumarenta de Nova Iorque. Meteram-se no ônibus, sempre muito alegres e extrovertidos. Todavia, no ônibus viajava um cidadão sempre macambúzio e voltado para dentro de si próprio, porquanto esquivo, e que não aceitava abrir conversa com ninguém.
Não só calado, mas profundamente triste, contrastando com a alacridade juvenil do ambiente. Mordicava os próprios lábios e parecia em cogitações estranhas.
Uma jovem do grupo, no entanto, conseguiu-se aproximar do mesmo e teve ensejo de formular-lhe estas perguntas que todos desejariam fazer, sem que tivessem coragem.
- Qual é o seu nome?
- Vingo.
- Que nome interessante! Você é casado?
- Não sei se sou casado.
- Como pode ser isto?
- Estou saindo de uma penitenciaria. Da prisao, escrevi pra minha mulher que estaria ausente muito tempo e que, se ela não agüentasse, se os nossos filhos começassem a fazer perguntas, e isto lhe fosse muito doloroso, me esquecesse. Eu compreenderia. “Arranje outro homem” – disse-lhe. Também acrescentei: “Não precisa escrever mais”. E, de fato, ela nunca mais me escreveu.
- E você está voltando para casa?
- É isso mesmo, pois, quando na semana passada me concederam livramento condicional, escrevi à minha mulher de novo. Existe, na entrada da cidade, onde morávamos, um grande carvalho. Se ela ainda me quiser de volta, deveria amarrar um lenço verde à árvore. Se, pelo contrário, não me desejasse mais, não amarrasse lenço algum.
- “Meu Deus”- exclamou a jovem, comovida.
“As moças e os rapazes ficaram todos sabendo da história. O ônibus começou a aproximar-se da cidade. Todos olhavam pela janela. Por fim, surgiu o frondoso carvalho. Vingo parecia petrificado. De repente, levantou-se e os seus olhos brilharam. O carvalho parecia uma árvore de Natal. Havia nele vinte ou trinta lenços verdes. Era uma mensagem extraordinária de boas vindas. Moças e rapazes se puseram a gritar, chorar e dançar dentro do ônibus. Vingo desceu e se foi ao encontro do amor e da vida”.
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A experiência de Vingo pode ser tomada à conta de uma versão moderna da Parábola do Filho Pródigo, uma das mais importantes contadas por Jesus.
Ela nos fala de um rapaz que, aborrecido com as disciplinas do lar, aproximou-se de seu pai, reivindicando:
Pai, dá-me a parte da herança que me toca.
Atendido em sua pretensão, partiu para país longínquo, onde em pouco tempo gastou a pequena fortuna que portava, vivendo dissolutamente. Era época de depressão. Grassava o desemprego. Sem grandes oportunidades, tudo o que conseguiu foi a função de guardador de porcos. Vivia miseravelmente, mal nutrido, com inveja até dos animais sob seus cuidados, que tinham alimento abundante. Afinal, depois de muito sofrer “caiu em si” e considerou, intimamente.
“Quantos servos de meu pai têm pão com fartura e eu aqui estou morrendo de fome”.
Decidiu, então, regressar.
Após longa viagem, coração pulsando em ritmo de emoção incontida, acercou-se da casa paterna. Estava irreconhecível, magro, roupas esfarrapadas, barba em desalinho, sujo – um verdadeiro mendigo. Mas o pai, com a secreta intuição dos que amam, reconheceu o filho e foi ao seu encontro. Este, a chorar copiosamente, ralado de arrependimento, disse:
- Pai, pequei contra o Céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho”.
O genitor, porem, não o deixou prosseguir. Ergueu o jovem, abraçando-o com efusão e, transbordando de júbilo, dirigiu-se aos servos:
- Trazei depressa a melhor roupa e vesti-lha; po0nde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés; trazei também o novilho cevado, matai-o, comamos e nos regozije-mos, porque este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado.
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A parábola é de clareza mediana. Todos nós, Espíritos em penosas experiências na Terra, somos os filhos pródigos que tomamos os patrimônios abençoados da Vida e os dilapidamos no vicio, nas paixões, no comprometimento com a superficialidade, enveredando por tortuosos caminhos.
Empolgados por motivações egoístas, inspirados na eterna preocupação com o próprio bem-estar, malbaratamos as oportunidades de edificação da jornada humana e nos situamos por eternos insatisfeitos.
E quando surgem as grandes atribulações, os períodos de dificuldade que testam nossas aquisições morais ou exigem a reformulação de nosso comportamento, ei-nos à semelhança do homem imprevidente que não se preparou quando na abundancia, para os dias de escassez. Espírito vazio de ideais, coração atrelado às sombras da inconformação, situamo-nos quais mendigos de paz, atormentados por dúvidas e aflições, em clima de infelicidade crônica.
Enquanto houver fome de paz em nós é porque continuamos distanciados da “casa de Deus”. O filho pródigo “caiu em si”, segundo a expressao evangélica, isto é, reconheceu a necessidade imperiosa de regressar. Este é o primeiro passo para a abençoada comunhão com o Criador: reconhecer que estamos afastados dele, tão longe quanto nos levou a rebeldia, espaço tão grande entre nós quanto o tamanho de nossa angústia.
É naquele exato momento em que, analisando nossa existência, sentimos o peso de nossa fragilidade e a futilidade dos interesses humanos, que nos colocamos em condições de encontrar o caminho para Deus, na intimidade de nossos corações.
A jornada será longa, árdua, repleta de sacrifícios – sobretudo o sacrifício de nossas vaidades e interesses pessoais, mas o resultado é amplamente compensador. Afinal, estaremos a caminho de nossa gloriosa destinação.
E como nos receberá Deus? Com castigos, em face de nossa deserção?
Com admoestações por nossa demora? Com a severidade do Senhor diante do servo em falta?
Não! Deus é o nosso pai. A parábola é muito clara a esse respeito. Festas e flores marcarão nosso encontro com Aquele que nos ama desde o principio; que nos chama, que nos guia, que nos espera...
Quando exercitamos a reflexão e a virtude, que nos desenvolvem “olhos de ver”, fatalmente enxergamos a Árvore da Vida, o Carvalho de Deus, repleto de bandeirolas luminosa, saudando nosso retorno à casa paterna.
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