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sábado, 23 de agosto de 2014

MARICOTA SERELEPE

História de Maricota

I - MARICOTA SERELEPE 
Maricota Serelepe 
Era menina travessa... 
Não havia disciplina 
Que lhe dobrasse a cabeça. 
Gostava de más respostas. 
Na escola, em casa, nas ruas, 
Vivia desordenada 
A fazer sempre das suas. 
Em vão, ganhava conselhos 
Dos amigos para o bem. 
Maricota Serelepe 
Não atendia a ninguém. 
Não era apenas sapeca: 
Fugia a qualquer dever. 
Vivia a brutalidade, 
Fazia o mal por prazer. 
II - MALCRIADA 
A mamãe aconselhava: 
- Minha filha, veja lá! 
Céu castiga a menina 
Que se faz grosseira e má. 
A pequena respondia: 
- A senhora nada sabe. 
Concluindo num cochicho: 
- Gente velha que se acabe. 
A professora também 
Lhe falava, com carinho: 
- Maricota, minha filha, 
Não saia do bom caminho! 
A aluna desrespeitosa 
Dizia, cabeça tonta: 
- O que eu fizer, professora, 
Não será de sua conta... 
III - INDISCIPLINADA 
Aos onze anos bem-feitos, 
Agindo e vivendo às cegas, 
A menina endiabrada 
Era o terror dos colegas. 
Desprezava os bons avisos. 
Por mais se lhe castigasse, 
Resistia às punições, 
Perturbando toda a classe. 
Rasgava livros, cadernos, 
Esvaziava tinteiros, 
Lançando borrões escuros 
À roupa dos companheiros. 
Tanto fez, tanto saltou 
A endiabrada menina, 
Que foi expulsa, mais tarde, 
Em favor da disciplina. 
IV - VADIA 
Desde então, ficou sabendo 
A vadiagem de cor; 
Sem conselhos e sem livros, 
Ficou pior, bem pior .... 
Dizia, à mamãe bondosa, 
Que prosseguia a estudar, 
Mas punha-se, em plena rua, 
A mentir e perturbar. 
Não lhe chegavam agora 
As horas grandes do dia. 
Depois de fechada a noite, 
A endiabrada fugia... 
Aprendeu na malandragem 
O furto, o assovio, a vaia; 
Em breve tempo, encontrou 
Meninos de sua laia. 
V - PREGUIÇOSA 
Escapulindo ao trabalho, 
Expulsa dos bens da escola, 
Fazia-se pobrezinha, 
Saindo a pedir esmola. 
Enganava os transeuntes, 
Prendendo-lhes a atenção; 
Xingava o trabalho sério 
E tinha horror ao sabão. 
Como o pássaro ocioso, 
Que a todo dia se atrasa, 
Maricota Serelepe 
Raramente vinha a casa. 
A mãe bondosa rogava 
Mais cautela, mais juízo, 
Mas a menina exclamava: 
- De conselhos não preciso! 
VI - MALDOSA 
Atacava os cães amigos 
A vozerio e pancadas; 
Tratava todo gatinho 
A brasa viva ou pedradas. 
Se avistava a palha seca 
Da casa dos passarinhos, 
Não hesitava um minuto: 
Vibrava golpes nos ninhos. 
Matava filhotes tenros 
Com grosseria sem-nome; 
Prendia as aves canoras, 
Exterminando-as à fome. 
Se passava no terreiro, 
A galinhada fugia, 
Sabendo que Maricota 
Vibrava pancadaria. 
VII - DESVIADA 
De rua em rua, a esconder-se, 
A menina, a passo curto, 
Era um demônio pequeno, 
Exercitado no furto. 
Varando portas estreitas, 
Pulando grandes janelas, 
Sabia correr dos guardas 
E burlar as sentinelas. 
Espreitava nas quitandas 
O instante exato das vendas, 
Para assaltar os meninos 
Carregados de encomendas. 
Fosse qual fosse o momento, 
Horas claras ou sombrias, 
Roubava doces, brinquedos, 
De lojas e padarias. 
VIII - MORTA 
Um dia, furtando jóias, 
Maricota teve a mão, 
Que se agitava com pressa, 
Mordida de escorpião. 
Era o castigo afinal, 
À maldade, à rebeldia; 
Maricota Serelepe 
Caiu em breve agonia. 
Pilhada por delinqüente, 
A menina envenenada 
Foi conduzida ao socorro, 
Deprimida, envergonhada. 
Não lhe valeu, todavia, 
O tratamento mais forte... 
Findo o dia doloroso, 
Em ânsias, rendeu-se à morte. 
IX - AFLITA 
Distante do corpo frio, 
Maricota, sem repouso, 
Notou que a morte era um anjo 
De olhar terno e carinhoso... 
Ajoelhou-se a coitada, 
Chorou e pediu assim: 
— Mensageiro da Bondade, 
Compadece-te de mim!... 
— Minha filha — disse ele —, 
Desejava auxiliar-te, 
Mas, há monstros que te buscam, 
Chegando de toda a parte. 
Depois de um minuto longo, 
Afirmou, cheio de dor: 
— Ah! filha, repara em torno, 
Pede o perdão do Senhor. 
X - CASTIGADA 
Maricota não mais viu 
A luz do emissário santo; 
Olhando em redor gritava, 
Tomada de enorme espanto. 
Buscava correr em vão... 
Oh! não, não queria ouvi-los! 
Eram serpentes, dragões, 
Lagartos e crocodilos. 
Os monstros, porém, chegavam... 
Um deles, grande inimigo, 
Disse a ela: — "Maricota, 
Agora estamos contigo. 
Somos filhos da maldade 
— Prosseguiu forte e iracundo -, 
Do furto e da vadiagem 
Que procuravas no mundo". 
XI - ATORMENTADA 
- Deixem-me, monstros! - pedia 
A Pobrezinha, a chorar; 
Mas os lagartos e as cobras 
Puseram-se a gargalhar. 
- Deixá-la? - disse o maior - 
Teu pedido não nos vence, 
Tua vida, Maricota, 
Desde muito, nos pertence. 
Ajudamos-te a roubar, 
A vadiar, a fingir... 
Agora, és nossa, bem nossa, 
Não podes escapulir. 
- Oh! que horror! - disse a infeliz. 
Ninguém para consolá-la!... 
Pôs-se, lívida, a correr 
E os monstros a acompanhá-la... 
XII - SUPLICANTE 
Longos dias, longas noites, 
Maricota, em aflição, 
Atravessou negros vales, 
Gritando e chorando em vão. 
Precipitou-se em abismos, 
Sem esperança e sem paz, 
Clamava, seguindo à frente, 
E os monstros seguindo atrás... 
Sentiu sede, sentiu fome, 
Na jornada em correria... 
Quanto tempo a padecer? 
Maricota não sabia... 
Depois de muita oração, 
Na angústia do cativeiro, 
Jesus, o Divino Amigo, 
Enviou-lhe um mensageiro. 
XIII - ANSIOSA 
Tão logo veio o emissário 
De socorro e salvação, 
Os monstros, espavoridos, 
Mudaram de direção. 
A menina, arrependida, 
Ajoelhou-se, entre ais, 
E exclamou: Anjo Divino, 
Socorro! não posso mais!... 
Tenho chorado e sofrido, 
Atormentada de dor. 
Por piedade! Salvai-me! 
Dai-me o Céu do Deus de Amor!... 
Fitando, de olhar dorido, 
O azul e estrelado véu, 
Suplicava compungida: 
- Dai-me a luz da paz do Céu!... 
XIV - AMPARADA 
O Anjo amoroso afagou-a, 
Dizendo com caridade: 
- Em nome da Providência, 
Devolvo- te a liberdade. 
Mas, ouve, minha menina: 
Se queres luz, agasalho, 
Não podes entrar no Céu, 
Sem a bênção do trabalho. 
Viveste pela maldade, 
Sem respeito, sem carinho, 
Não ouviste os bons conselhos, 
Fugiste do bom caminho. 
Aceitas a corrigenda 
Do Pai bondoso e perfeito? 
Maricota, ajoelhada, 
Em pranto, exclamou: Aceito! 
XV - CORRIGIDA 
Foi então que apareceu, 
De feia e enorme estatura, 
Um zelador de crianças: 
O Gigante Mão Segura. 
O mensageiro do Cristo 
Explicou-lhe: Esta menina 
Necessita recolher-se 
Aos campos de disciplina. 
Até que se regenere, 
Dê-lhe recursos de emenda. 
Praticou muita maldade, 
Precisa de corrigenda. 
Nesse instante, Maricota 
Foi levada, em aflição, 
Para um campo escuro e triste 
De serviço e de prisão. 
XAVIER, Francisco Cândido. História de Maricota. Pelo Espírito Casimiro Cunha. FEB.

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