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quinta-feira, 6 de agosto de 2015

O VELHO PAI

    O Velho Pai

    O cenário é comum, a cena é singela. Num banco de jardim da casa estão sentados umhomem idoso e um jovem.

    O jovem lê o jornal, com atenção. O idoso parece imerso em algo indefinível.

    Então, um pequeno pássaro pousa no arbusto próximo e canta. O homem parece despertar e indaga:

    O que é aquilo? - apontando com o dedo na direção da pequena ave.

    O rapaz alça os olhos e diz, secamente: É um pardal.

    A avezita saltita de um galho a outro e a pergunta se repete: O que é aquilo?

    A resposta agora não é somente seca, mas também denota enfado: Já disse, é um pardal!

    O pássaro voa do arbusto para a árvore, continuando na sua dança matinal.

    O que é aquilo? - soa de novo.

    Agora, o rapaz se irrita e quase grita: É um pardal!

    A ave, feliz, prossegue no seu bailar. Alça voo e parece desaparecer. Poucos segundos passados e retorna ao chão, bicando aqui, saltitando acolá.

    homem leva a mão aos olhos, como se desejasse ajustar a visão embaçada e, com natural curiosidade, pergunta:

    O que é aquilo?

    O filho responde, em altos brados: É um pardal! Já disse: um pardal.

    E soletra, aos gritos: P - a - r - d - a - l. Você não entende?

    homem se ergue, sobe os degraus, adentra a casa, lento e decidido. Pouco depois, retorna com um velho caderno nas mãos.

    A capa é bonita, denotando que foi guardado com cuidado, como se guardam preciosidades.

    Abre-o, procura algo, depois o entrega ao rapaz, ainda inquieto e raivoso.

    Leia! - ele pede. E acrescenta: Em voz alta!

    Há surpresa no moço, que lê pausada e cada vez com maior emoção: Hoje, meu filho caçula, que há uns dias completou 3 anos, estava sentado comigo, no parque, quando um pardal pousou na nossa frente.

    Meu filho me perguntou 21 vezes o que era aquilo e eu respondi em todas as 21 vezes que era um pardal.

    Eu o abracei todas as vezes que ele repetiu a pergunta, vez após vez, sem ficar bravo, sentindo afeição pelo meu inocente garotinho.

    Então, o filho olha o pai. Há culpa e dor em sua alma.

    Abraça-o, lacrimoso, beija-lhe a face, emoldurada pela barba por fazer.

    Estreita-o, puxando-o para perto de si. E assim ficam: um coração ouvindo outro coração.

    Cenas como essa acontecem todos os dias, em milhares de lares, em todo o mundo.

    Nossos anciãos, de braços dados com Alzheimer, demência senil ou problemáticas outras, indagam, perguntam, questionam.

    A memória recente lhes falha. Mergulhados em retalhos de lembranças do passado, não entendem porque recebem gritos como resposta.

    Pensemos nisso! E se as lágrimas nos umedecerem os olhos, não tenhamos vergonha de abraçar com amornosso velho pai, nossa mãe, vovó, vovô, madrinha, tia... Agora.

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