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segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Escrito por Jaqueline Silva   
Pais e filhos
Os frutos e as consequências desse relacionamento serão colhidos de acordo com a disposição dos pais em mostrar o caminho
“Eu quero fazer engenharia mecânica na UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná) e também nanotecnologia na USP. Quero aprender tudo isso para implantar em carros, para que assim, possam ser movidos pelo ar”. Esse é um dos sonhos de Caio Sanches Rodrigues, de apenas 12 anos. Apaixonado por livros, os pais sempre o incentivaram a ler. “Às vezes, é uma hora da manhã e ele ainda está lendo. Precisamos pedir para ele dormir”, diz a mãe, professora e pedagoga, Leila Regina Sanches.
Mas apesar do filho “prodígio”, a disciplina e os limites sempre foram pontos fundamentais na educação de Caio. O publicitário Ivan Piccolo Sanches, pai do adolescente, faz questão de ressaltar que é fundamental a existência de limites.
Este é apenas um dos tantos problemas do mundo moderno. A psicóloga Adriana Baron comenta que a dificuldade de relacionamento entre pais e filhos na atualidade pode ocorrer por diversos motivos e “muitas vezes o orgulho e o egoísmo falam mais alto, ou a falta de limites faz o desrespeito ‘ganhar’ espaço na vida familiar”.
Compromisso dos paisEm O Livro dos Espíritos (Allan Kardec), é possível verificar a mesma linha: o orgulho e o egoísmo são as principais razões de grande parte dos problemas. Na visão espírita, os pais assumiram o compromisso de criar e educar um ser vivo. Como consequência, em alguns casos, a ingratidão dos filhos pode estar ligada diretamente à educação que os genitores ofereceram para tal. “A mulher saiu de casa para entrar no mercado de trabalho. Hoje, a vida dos pais é agitada. Quando o casal chega em casa, quer compensar sua ausência”, diz o pediatra Claudio Pinto.
O problema é que essa “compensação” pode acarretar inúmeros problemas, como a obesidade, por exemplo. O médico afirma que a facilidade da tecnologia faz com que as crianças se tornem mais sedentárias e fiquem mais atentas a novos produtos no mercado. “Os pais compram o que os filhos querem. O resultado disso? Elas comem a toda hora. Não existe um horário certo para as refeições e, sim, uma má alimentação. Cada vez mais, vêm ao meu consultório crianças obesas”, diz ele.
Outro ponto importante é a falta de tempo dos pais, que por não terem a oportunidade de cuidar de suas crianças, optam pela creche. Aí, surge outro problema, de acordo com o pediatra: as crianças estão mais vulneráveis às gripes, aos problemas pulmonares e até mesmo às infecções. O sistema imunológico do ser vivo está completo apenas aos 7 ou 8 anos de idade e, nesta fase, a criança não fica mais tanto tempo na escola.
Pais e filhosA escola e os princípios
O ambiente escolar tem sido outro ponto de grandes questionamentos nos dias atuais. “Cabe à escola reforçar os princípios morais que já foram instituídos em casa”, comenta a pedagoga e professora Ivelise Silva. Mas, não é isso que ocorre. Na prática, avalia a pedagoga, os pais tiram a autoridade do professor e, consequentemente, as crianças e adolescentes se espelham nas mesmas atitudes.
No capítulo Pluralidade das Existências de O Livro dos Espíritos, os espíritos apontam que os pais “têm como missão desenvolver os seus filhos pela educação. É para eles uma tarefa: se falharem, serão responsabilizados”.
Ivelise afirma que na modernidade, o problema não está na liberdade de diálogo, diferentemente das décadas de 60 e 70, mas na falta de limites dos pais. “É preciso ter autoridade sem autoritarismo”. Esse é um dos lemas de Leila, que leva à risca também a disciplina. Se antes ela perguntava para Caio como havia sido o seu dia, agora os papéis se invertem. “O resultado da educação dos filhos vem dos pequenos atos” afirma. E acrescenta que não é preciso estar ao lado dos filhos todo o tempo, mas que o tempo de convívio tenha qualidade de relacionamento. “Se o tempo que passamos com eles nos permite passar valores, afetividade, conhecê-los e fazer-nos conhecer por eles, estamos investindo num bom relacionamento”, diz Adriana Baron.
Afeto e saúde
Na realidade, para muitos profissionais, a grande chave disso tudo é a afetividade. E já começa com o nascimento do bebê. “Pesquisas atuais demonstram uma relação entre afeto e saúde, em que o afeto está para a saúde psíquica na mesma proporção em que o alimento está para a saúde física”, diz a psicóloga Liliam Gusso. Ela coordena um curso sobre parto humanizado e parto amoroso no Centro de Apoio às Mulheres e ao Casal Grávido, em Curitiba.
Segundo Liliam, durante a gravidez o vínculo afetivo inicia quando os pais começam a ter as primeiras concepções em relação ao bebê. Depois que a criança nasce, o “abraço carinhoso” começa a ter significado. Ele desperta na criança um bom relacionamento com ela mesma e, mais tarde, ajuda a realizar a socialização da troca de afeto dela com as pessoas de seu convívio.
As horas existentes em um dia continuam sendo as mesmas de 30 anos atrás. Mas então, por que sempre temos a impressão de que “não temos tempo para nada”? De acordo com a psicóloga isso é simples: na era moderna, é possível realizar tudo em um único dia. Mas, com o progresso vêm as mais diversas consequências. Conforme Liliam, no mundo moderno existem dúvidas ao educar uma criança, então, já que vivemos em uma sociedade consumista, é preciso “corrigir constantemente o que está desviando o caminho” para mais tarde o jovem não incorrer, por exemplo, no uso ou abuso de drogas ilícitas e até mesmo a entrada na criminalidade. “O mundo está repleto de casos em que as separações mais dolorosas são necessárias. Mas as afeições nem por isso se rompem, o afastamento não diminui, nem o respeito, nem a dedicação que se deve aos pais, nem a ternura para com os filhos” (O Livro dos Espíritos, capítulo Moral Estranha).
Relação de troca
Nessa relação de pais e filhos existe uma troca. Porém, os “frutos” somente serão colhidos se os “guias” estiverem dispostos a mostrar o caminho. Caio tem consciência de todo esse trajeto. “Do jeito que o mundo está, tem que controlar. Do portão para fora, a gente não sabe como está”, diz o garoto. Tanto Leila quanto Ivan procuram dar um pouco de autonomia ao adolescente. O casal afirma que o criou para ser independente, mas o educam de forma a aprender a pensar. “A Doutrina Espírita nos ensina a dimensão da consciência de sermos pais”, diz a mãe.
Porém, Adriana lembra que as decisões dos pais dependerão do seu livre-arbítrio. Afinal, comenta ela, os filhos são espíritos também e trouxeram uma bagagem de outras encarnações e “assimilarão mais ou menos os valores que procuramos transmitir-lhes de acordo com o que puderem apreender nesse momento”. A falta de carinho e o abuso de limites são danos que, a longo prazo, trarão inúmeras dificuldades. O médico argumenta que os pais precisam repensar a forma de compensar os filhos e, garante ele, a melhor saída é a presença física e amorosa.
Caio, por exemplo, reclama que precisa lavar a louça, arrumar a mesa ou arrumar a própria cama, mas no fundo tem uma opinião bem clara em relação às determinações de seus pais. “Eles lapidam as pedras brutas para depois as tornarem preciosas”, conclui. 

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